Farinha Lima

Maria Jatinhos

Faria Lima à deriva – o luxo cercado por barracas, abandono e muito perfume francês  |  Foto: Imagem feita com auxílio de IA

Publicado em 23/04/2025, às 07h00   Foto: Imagem feita com auxílio de IA   Farinha Lima

Maria Jatinhos

Uma baiana famosa por seus dotes encantadores e fatais abandonou de vez os voos lotados para terra da garoa e com preços de Europa. A mocinha bem arisca encontrou, nas caroninhas de empresários e banqueiros nacionais, o conforto dos jatinhos possantes. Sempre com seu perfume Dior Addict e sua Bolsa Hermes Birkin, ela cruza o hangar que nem uma “rainha" deixando os cuecas babando. A atividade chave dela é o famoso “lobby”. Entre o Itaim, Faria Lima, Brasília e Goiás, a bela de ares misteriosos vai passando o rodo e fazendo alguns deputados de PESO balançarem nos seus casamentos. Os Farinhas de Lima de plantão já a conhece de outros verões “trancoseiros” e já sentiram na pelen(e no bolso) o poder de sua “dentada”.
 
Foto: Imagem feita com auxílio de IA

Ternos italianos e colchões velhos

Na São Paulo dos CEOs e do café com leite de amêndoas a R$ 18, a Faria Lima virou passarela não só de ternos italianos, mas também de colchões velhos e barracas improvisadas. Enquanto os donos do capital fazem networking nos rooftops, a calçada virou endereço fixo de quem foi expulso do mercado, da casa e da dignidade. O Largo da Batata, que um dia foi sinônimo de barzinho e happy hour, acaba abrigando uma realidade tão dura que nem os filtros mais modernos do Instagram conseguem esconder: um amontoado de pessoas tentando se manter de pé entre a gentrificação e o descaso – algo quase surreal.
 

Obscenidade

Os números são tão obscenos quanto os aluguéis da região: 93 mil pessoas vivendo nas ruas de São Paulo, segundo levantamento de janeiro de 2025. Mais da metade está na capital, e boa parte na própria Faria Lima — símbolo máximo da ostentação paulistana. E antes que alguém sugira que a culpa é da falta de “meritocracia”, vale lembrar que 70% dessa população é negra e mais de 80% são homens — descartáveis para o sistema, úteis apenas como dado estatístico. 
 

Enquanto isso ...

O posto da PM recém-instalado continua desligado – talvez esperando um WiFi decente ou, diga-se de passagem, uma ordem lá do alto, direto dos andares onde mora a desigualdade.
Enquanto uns dormem nas calçadas, outros já estão reservando lugar na primeira classe do apocalipse urbano.
 
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Nas alturas

Enquanto a calçada da Faria Lima se transforma em dormitório a céu aberto, a Embraer mira nas nuvens com seu eVTOL — o “carro voador” - que promete levar os ricos do coração financeiro de São Paulo até Guarulhos em 13 minutos, ignorando o trânsito, a crise urbana e, claro, a plebe. Com estreia prevista para 2026 e quase 3 mil pedidos já em carteira, o projeto é vendido como solução de mobilidade, mas soa mais como fuga aérea de um país onde os números da desigualdade só crescem — e a elite, literalmente, já começou a decolar.
 
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Do púlpito ao perdão

Em 2021, o então deputado estadual Fred D’Avila resolveu subir na tribuna da Alesp e fazer um verdadeiro exorcismo verbal contra a Igreja Católica. Chamou o papa Francisco de “vagabundo”, disparou contra a CNBB e o arcebispo de Aparecida, e ainda misturou teologia com fake news armamentista, como quem mistura vinho de missa com gasolina. Na época, parecia mais interessado em lacrar para os seguidores do bolsonarismo do que em seguir qualquer evangelho. Como consequência, enfrentou um processo ético, foi repreendido pela CNBB e até teve uma suspensão aprovada, mas impedida pela Justiça. A fé, aparentemente, move montanhas — ou pelo menos embarga votações.
 

Perdão e campanha

Um ano depois, com o mandato já encerrado e sua trajetória política abalada, D’Avila surgiu na varanda do Vaticano, demonstrando humildade e arrependimento, buscando o perdão do papa que antes havia insultado. Francisco, conhecido por perdoar até mesmo os maiores transgressores, respondeu com uma absolvição padrão: “Deus perdoa todos os pecados”.
O ex-deputado agora vende o episódio como “grande aprendizado”, numa tentativa de transfigurar a vergonha pública em testemunho de fé — e quem sabe abrir caminho para uma ressurreição eleitoral. Porque, convenhamos, entre o altar e o palanque, tem político que confunde confissão com campanha.
 
Foto: Imagem feita com auxílio de IA

Esgotamento bilionário

Em um cenário onde o esgoto correndo livremente ainda é uma cena corriqueira em muitos lugares, a Sabesp e a Aegea se preparam para uma grande competição: uma disputa por concessões de água, tratamento de esgoto e, possivelmente, sistemas de drenagem em 211 municípios de São Paulo, um negócio estimado em R$ 25 bilhões. A farra faz parte do projeto do governador Tarcísio de Freitas de privatizar até a sombra, embalado no discurso de eficiência enquanto vende a alma do saneamento ao setor privado. As empresas — uma recém-passada para a Equatorial, a outra com fundo soberano de Singapura no controle — enxergam a divisão do mapa em cinco regiões como um mapa do tesouro. Só falta combinar com quem mora nas áreas onde água limpa é luxo e drenagem é ficção.
 

Quem tem telhado de vidro não aguenta bolada

Na Faria Lima não se fala em outra coisa: a partida jurídica-futebolesca na qual o cartola de toga levou um carrinho do colega zagueiro.

A invertida ao vivo, durante transmissão de mais um clássico da CBF, deixou figurões do futebol em estado de alerta. O lance foi violento, mas o juiz preferiu deixar o jogo seguir, sem marcar qualquer penalidade. Até mesmo a chamada de VAR poderia inflamar a torcida, revelar esquemas de apostas milionárias e trazer à tona outros lances ainda ocultos.

É aquela velha máxima: quem fala o que quer, ouve o que não quer. E no caso, corre de boca em boca, o ditado mais falado é: quem tem telhado de vidro, não aguenta bolada.

Farinha Lima

Semanalmente, a coluna Farinha Lima revela notas impublicáveis sobre o Condado mais influente da economia brasileira — bastidores, personagens e tudo o que acontece, nem sempre de forma republicana, entre cafés artesanais e planilhas abertas na Faria Lima.

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